sábado, 12 de fevereiro de 2011

O bom soldado de Wakamatsu


"O Bom Soldado é filme anti-erótico de uma brutalidade emocional invulgar. Dois corpos nus e cenas de sexo não fazem obrigatoriamente uma cena erótica. Um soldado da II Guerra cino-japonesa regressa a casa decepado de pernas e braços. O soldado aparece-nos já assim, sem pernas nem braços. E como se não bastasse, também não fala, está meio desfigurado, ouve mal e, azar dos azares (acreditem que, no caso, é mesmo um azar), os seus órgãos sexuais funcionam na perfeição. A mulher, na mais castiça aldeia japonsesa, recebe e cuida deste homem-vegetal, pregado de medalhas, idolatrado ao ponto de lhe chamarem Deus da Guerra. Come e dorme, e só não é um bebé porque também copula.
Wakamatsu vai mais longe do que refletir sobre a condição humana numa situação limite. Ele faz um jogo cruel, de crime e castigo. Coloca o espoliado ao alcance do nosso ódio. Tudo é demasiado horrível. Concordamos até com o primeiro impulso da mulher, que a única atitude digna que poderia tomar seria a morte. Seria a nossa própria boia de salvação.
Há esse jogo de culpas feito, precisamente, através do sexo. Foi o sexo forçado, a violação, e não um acto de bravura, que o desmembrou, e é pela mesma via que é castigado, em semelhante ato de vingança, sem sombra de erotismo. Ao mesmo tempo é posta em causa, ou melhor, ficam deitados por terra os mais vulgares conceitos de heroísmo e bravura. O seu heroísmo torna-se absurdo e quase risível, até ao fim. Desmancham-se os mitos e ergue-se o desespero E, por esse lado, é feita uma leitura transversal, da pequena para a grande escala. Enquanto nos deixamos imiscuir no ambiente da pequena aldeia japonesa, vamo-nos apercebendo dos desenvolvimentos históricos, das atrocidades cometidas na Invasão da China até à queda do império, de forma drástica, com a mortandade que foram as bombas de Hiroshima e Nagasaki. Fica a ideia que foi o próprio Império que perdeu as pernas e os braços. E por culpa própria." in http://aeiou.visao.pt/

Aconselho vivamente. 

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